quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Regresso ao passado




Vagueando por Lisboa em tempo de férias, passei hoje na minha primeira escola. E, levada por não sei que impulso, resolvi entrar. Foi como se tivesse voltado atrás no tempo.
Foram alguns minutos de emoção, durante os quais revivi, subitamente,  muitas memórias da minha infância. Voltei a ouvir a algazarra das vozes e o som da  campainha, a sentir o cheiro dos cadernos novos, misturado com as aparas dos lápis e do saquinho da merenda dentro da pasta, a repetir mentalmente os poemas que sei de cor até hoje: "Batem leve, levemente, como quem chama por mim...", a relembrar imagens da menina que eu era então e mil lembranças de um tempo já muito distante, mas que deixou em mim marcas profundas e recordações que me têm acompanhado a vida toda.
Ainda são as mesmas escadas, o mesmo corredor no rés-do-chão, onde ficava a minha sala de aula, na segunda porta à esquerda. A sala de professores ainda é no mesmo sítio. E até a campainha soa ainda da mesma maneira.
O que mais me impressionou, no entanto, foi o pátio, que já não tem o ar austero de outros tempos, nem as velhas arcadas onde nos abrigávamos da chuva e em cujas grossas colunas jogávamos às escondidas. O pátio tem agora cores e desenhos, é talvez mais incaracterístico, mas é também a prova de que aquele tempo, que eu trago na memória, é um tempo que já passou.
Neste lugar, que na época me parecia tão grande e hoje vi muito mais pequeno , fui feliz e infeliz.
Lembro-me do primeiro dia,  do meu ar tímido e atrapalhado, de não saber o que fazer quando ouvi chamar  o meu nome em voz alta. E de como a professora nos ensinou, no primeiro dia de aulas, a desenhar as vogais no ar. Lembro-me do que chorei, dias a fio, por me sentir sozinha e abandonada, perdida no meio de tanta gente que não conhecia de lado nenhum.
E depois como, pouco a pouco,  me fui afeiçoando ao carinho da professora, D. Esmeralda, que não gritava nem batia, que sabia ser doce e  que foi, sem o saber, uma das figuras marcantes da minha vida. Nunca mais a vi, não sei o que foi feito dela, mas os seus traços permanecem nítidos na minha memória, assim como a sua enorme alegria e a ternura com que me deixava sentar no seu colo, quando me sentia triste.
Lembro-me do meu orgulho quando ela lia em voz alta as minhas redacções e as dava como exemplo e como, com ela, fui aprendendo, subtil e lentamente, o prazer da leitura e da escrita. Foi ela que me fez perceber que a escola era uma janela aberta para o mundo e podia ser um lugar de felicidade.
Essa D. Esmeralda, de quem guardo até hoje  uma muito terna recordação, mostrou-me, com o seu exemplo, que são os bons professores que fazem as boas escolas e terá sido, para mim, entre muitas outras coisas, uma inspiração. Não sei se por causa dela, ou por causa do destino, foi aqui que a minha ligação à escola se fez definitiva. Mas, naqueles anos de inocência, não imaginava nem por um segundo que a escola viria a estar, de certo modo, no centro da minha vida. Para sempre!  

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