quinta-feira, 11 de julho de 2013

(In)certezas


Nunca acreditara realmente que as coisas, todas as coisas, pudessem julgar-se garantidas, ou definitivas, nem na predestinação, ou naquela ideia um pouco pueril de que algures no mundo havia alguém que lhe estaria destinado, uma espécie de alma gémea, conceito que na verdade nunca tinha conseguido entender. O que seria uma "alma gémea"? Soava-lhe sempre à imagem de si ao espelho, algo parecido com "mais do mesmo" e, por isso, profundamente desinteressante.
Acreditava, sim, nos encontros fortuitos e nas almas e corpos que de repente  se aproximam e se fundem no inexplicável que é o amor, na repentina falta de domínio sobre a vontade e na explosão dos sentidos, em momentos perfeitos de desejos à solta e de entrega incondicional e inteira, rendição do corpo e da alma tornadas inevitáveis e urgentes, não deixando querer nem pensar mais nada, porque, em momentos assim, nada mais importa.
Sabia que havia certos homens a quem era impossível dizer não, como sabia que havia feridas que demoram a cicatrizar e recordações que doem para sempre. Conhecia a falta de olhos, de risos e de corpos, e os suores frios de certas febres que se devem a males da alma, mais do que do corpo. Conhecia a amargura e a solidão das noites em que tremia de frio por dentro e a saudade lhe doía demais, quando não sentia no ar o cheiro de um perfume que lhe era familiar, nem  as mãos que desatavam vontades, à deriva pelo seu corpo em sobressalto, descontrolado em arrepios estremecidos de prazer, e em gestos  e palavras transbordantes de ternura.
Mas  sabia, também, que o mundo continuava a girar, que os dias e as noites se sucediam inexoráveis, e às vezes voltava até a sentir o coração a acelerar em alvoroço, como numa paixão de vinte anos, na luz de outros olhares que despertavam vontades súbitas, inesperadas e incertas, fugazes ou duradouras, que  lhe pareciam muito e outras vezes coisa nenhuma, que lhe apetecia provar  em pequenos sorvos, como uma bebida que se vai saboreando devagar, ou beber de um trago, como quem é tomado de assalto pelo desejo de saciedade e de tudo a acontecer de novo como se fosse a primeira vez e a doce inquietação do desejo estivesse de volta, dissolvendo e mantendo incertezas.

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